quinta-feira, 3 de julho de 2008

NOS NAO SOMOS CISNES, SOMOS PATOS

por Nizan Guanaes
enviado por Cesar

Nesses últimos 40 anos, nós, publicitários, construímos coisas grandes e belas. Juntos fizemos o país gostar de propaganda. E fizemos a propaganda brasileira ser admirada no mundo. O povo brasileiro gosta de propaganda. E gosta da nossa propaganda. Tornamos os publicitários conhecidos e respeitados. Participantes da vida do país. Famosos além do muro da propaganda. Entretanto, de alguns anos para cá, deixamos alguns mauricinhos, em seus ternos engravatados, tentarem tornar suas verdades cinzas em verdades nossas. E tentam tornar essas meias-verdades em verdades absolutas. Lero-lero do tipo: "Só no Brasil o publicitário tem a importância que tem". Mentira. Lord Saatchi é publicitário. Virou Lord, tem uma das maiores coleções de arte do Reino Unido. E é parte atuante do stablishment inglês. Assim como Sir Martin Sorell é hoje. E como Sir David Ogilvy foi no passado. Assim como Jacques Séguéla tem participação atuante na política francesa. E James Carville é figura conhecidíssima nos Estados Unidos. Todos com visibilidade, programa de TV, livro. Dizendo coisas geniais ou pisando no tomate como todos nós mortais. Mas, de tanto ouvir essas nulidades repetindo que nossas gravatas são extravagantes, que aparecemos demais, que somos barbies, estamos jogando na retranca. E, com medo disso, ao preenchermos a ficha do hotel, nos denominamos empresários. Falamos agora todos iguais. Nos vestimos todos agora tom sobre tom. As nossas respostas são todas respostas de miss. Está na hora desse mercado ser um pouco mais ele mesmo. Estão faltando frescura, frivolidade, charme. É preciso ter pertinência, consistência, responsabilidade, mas não é preciso ser tão chato. Propaganda é uma atividade de artista. É uma indústria séria como o cinema. Mas é também uma arte. É uma arte cara, feita por pessoas especiais. Meio malucas. Não são patos. São cisnes. Que tiram idéias grandes de coisas banais. Que tornam um produto uma marca. E que fazem fortuna para os outros. E que têm de ser, portanto, reconhecidos, bem pagos e ouvidos nessa sociedade como Isay Weinsfield, os Irmãos Campana ou Fernando Meirelles. E, se não são especiais, se não são interessantes, se não têm idéias inusitadas, não são publicitários. E, portanto, não merecem as regalias, a visibilidade e nem serem ouvidos.Mas não podemos deixar os comuns tentarem nos envergonhar de termos nascido diferentes. Não seja um publicitário enrustido, amigo. Vamos lá. Vamos sair do armário. Sim, mãe. Sim, pai. Eu sou publicitário. Carrego dentro de mim essa gravata com estampa. Sim, eu tenho esse ego que dizem que é de publicitário (mas que parece também em médicos, políticos, engenheiros, arquitetos, atores de cinema). E, apesar dessa meia vermelha, eu pago meus impostos e faço o país crescer. Gero empregos, fabrico riquezas e divisas. Sim, eu sou publicitário. Gosto de coisas com design, amo trocadilhos e frases de efeito. Mas os monges também têm seus jargões e seus tiques. E, pelo fato de ser um cisne, não vou passar a vida me fantasiando de pato. Só para os patos de nascença sintam-se melhores. É claro que um texto como esse é um prato cheio para o rancor, para a lição de moral. Para os torquermadas que usam a falsa humildade para lançarem pensamentos diferentes na fogueira. Mas vamos lá, meus amigos. Chega de bancarmos os empresários. De tentarmos ser low-profile que nem banqueiros. Que os banqueiros sejam banqueiros, que os empreiteiros sejam empreiteiros e que nós sejamos nós. Artífices da palavra, espíritas de idéias. E, por sermos assim diferentes, a Rainha nos batizará como Lords. O povo cantará nossas músicas e contará nossos filmes. Sejam os publicitários como o nosso companheiro, o jornalista Roberto Marinho, foi sempre: jornalista Roberto Marinho. E, sendo jornalista e apaixonado por seu ofício, construiu um império. Não, esse mercado não pode ser tomado por mauricinhos que não fazem anúncios. Só fazem lobby. Que ficam puxando o saco de empresários e imitando esses empresários como replicantes. Nós somos o inconformismo. A voz da New Age. Os filhos de Aquário. Nós somos, perante a indústria e o comércio, a vozes dos jovens, do povo. Nós somos o novo, o imprevisível, o diferente. Perante o banqueiro sisudo, o empresário que vive preso no seu escritório, no seu universo, no seu mundo, nós somos a voz das bichas e dos chapados. Nós somos os pontos de interrogação nas organizações. A contramão. A provocação. E, se deixarmos de ser isso, nosso espaço nessa sociedade será nenhum. Como aqueles que tendo nascido cinzas, chatos e mauricinhos querem. Que fiquemos todos iguais para sermos patos como eles.

Nizan Guanaes fez este texto para os quarenta anos da Revista Propaganda.